NOVOS OGM: O DEBATE CONTINUA – Voto do Parlamento Europeu sobre Novas Técnicas Genómicas revela profundas divisões

NOVOS OGM: O DEBATE CONTINUA – Voto do Parlamento Europeu sobre Novas Técnicas Genómicas revela profundas divisões

Lisboa, 12 de Fevereiro de 2024 – Numa decisão amplamente observada, o Parlamento Europeu votou no passado dia 7 de Fevereiro sobre a proposta da Comissão Europeia relativa às plantas produzidas com Novas Técnicas Genómicas (NGT na sigla inglesa) ou Novos OGM. O resultado da votação, muito disputada, sublinha a natureza complexa e divisiva da questão.

A votação, que terminou com uma estreita maioria a favor da desregulamentação de plantas Novos OGM/NGT, provocou elogios da Comissão Europeia e dos lobistas da indústria da Biotecnologia, mas recolheu preocupações profundas de diferentes sectores.

Interesses Corporativos vs. Preocupações com a Biossegurança

Defensores da indústria da Biotecnologia vêem a decisão como um passo positivo rumo à simplificação das regulamentações e à promoção da inovação. De acordo com a Corporate Europe Observatory (CEO), o voto reforça um movimento para eliminar o que os defensores percepcionam como regras de segurança onerosas. A produção de sementes OGM representa um mercado extremamente concentrado do qual 60% é controlado por apenas quatro empresas, que por seu lado também controlam o mercado de agroquímicos. O seu lóbi intensivo já conseguiu travar o regulamento de pesticidas (SUR), que prometia reduzir o uso de pesticidas com 50% até 2030.

Por outro lado, organizações ambientais como Amigos da Terra Europa e Greenpeace, e representantes dos sectores da Agricultura Biológica e Biodinâmica e Não OGM, IFOAM, Demeter, e ENGA, expressam profunda apreensão quanto às potenciais consequências da desregulamentação. Argumentam que a decisão remove verificações de segurança essenciais, colocando o meio ambiente, os agricultores, e os consumidores em risco. O facto de os Novos OGM, tal como os OGM de primeira geração, gozarem de patentes, representa um duplo risco: o da restrição nas variedades de plantas disponíveis para criadores e agricultores e o da contaminação de campos, cujos custos serão suportados pelos contaminados.

Pequena Vitória: Sim à Rastreabilidade e Rotulagem

Apesar da derrota geral, houve algumas conquistas inesperadas, nomeadamente a manutenção de medidas para rastreabilidade documental e rotulagem. Estas emendas conseguidas visam proteger a escolha do consumidor e permitir ainda regulamentações nacionais para a coexistência, incluindo o direito de retirar a autorização de um Novo OGM caso forem descobertos riscos para a saúde humana e animal ou para o ambiente.

Chamada para um Debate Contínuo e Limites Claros

Vozes de organizações como Testbiotech e Save Our Seeds instam a uma contínua escrutinização dos Novos OGM e um debate mais amplo, tendo em conta as dúvidas científicas que persistem sobre a sua segurança. Destacam a necessidade de haver limites claros à utilização de Novos OGM e uma supervisão rigorosa para mitigar os potenciais riscos associados à desregulamentação.

Próximos capítulos

À medida que a poeira assenta sobre este voto controverso, torna-se evidente que o debate em torno dos Novos OGM/NGT está longe de terminar. O Conselho Europeu não está a conseguir a maioria qualificada necessária para aprovar a proposta, com países importantes como Bélgica e Alemanha a afirmarem abster-se e países como Áustria, Hungria, e Polónia activamente a resistir. Órgãos consultivos como o Comité dos Representantes Permanentes dos Governos da UE (CoRePer) e o Comité das Regiões Europeias (CoR) deram parecer negativo ao dossier NGT.

As negociações sobre os Novos OGM/NGT estão a expor as profundas divisões dentro da União Europeia em relação à biotecnologia e ao futuro da agricultura. O debate ainda só parece ter começado, à medida que os diferentes responsáveis políticos, os agricultores, e o público em geral tomam consciência das profundas implicações do uso não regulamentado da biotecnologia para a segurança alimentar, a sustentabilidade ambiental, e os direitos dos consumidores e agricultores.

Notas:

  1. Os/as eurodeputados/as portugueses/as votaram maioritariamente a favor da desregulamentação. Os partidos PSD e PS são claramente a favor, com o eurodeputado Carlos Coelho (PSD) o único a rebelar, tendo-se abstido. Apenas os/as eurodeputados/as do PCP, BE e o independente Francisco Guerreiro votaram contra. O eurodeputado do CDS, Nuno Melo, não compareceu à votação final, mas votou a favor das emendas individuais pró-desregulamentação.
  1. Breve cronologia das opções políticas da UE sobre a sustentabilidade da agricultura europeia:2020 – apresentação das estratégias do “Prado ao Prato” e “Biodiversidade” com as metas de aumentar a Agricultura em modo de produção Biológico para 25% da área agrícola da UE e reduzir o uso de pesticidas em 50%, até 2030; Julho 2023 a Comissão Europeia apresenta a proposta de desregulamentação dos Novos OGM/NGT para discussão e posterior votação no Conselho de Ministros Europeus da Agricultura e no Parlamento Europeu; Novembro 2023 – renovação polémica da autorização de comercialização do herbicida glifosato por mais 10 anos e o chumbo paralelo do regulamento SUR (uso sustentável de fitofármacos, na sigla inglesa). Estes regulamentos e autorizações são cruciais à indústria da biotecnologia enquanto nos afastam cada vez mais das estratégias Prado ao Prato e Biodiversidade. Dezembro 2023 – o Conselho de Ministros Europeus da Agricultura não consegue uma maioria qualificada a favor da proposta dos Novos OGM, sendo a questão das patentes a mais polémica; 24 de janeiro 2024 – A Comissão do Ambiente do PE integra emendas propostas pelos eurodeputados à proposta inicial da CE, tendo o relatório sido aprovado com 47 votos a favor, 35 contra e 4 abstenções; 6 de fevereiro 2024 – discussão da proposta aprovada na Comissão do Ambiente em plenário do PE; 7 de fevereiro – votação no plenário do PE e aprovação com 307 votos a favor, 263 contra, e 40 abstenções, tendo-se obtido no entanto a obrigatoriedade de rotulagem e rastreabilidade documental dos Novos OGM (Emendas 264 e 265) e ainda a cláusula de salvaguarda (Emenda 266), e tendo sido chumbadas as propostas mais polémicas da Comissão de Agricultura do PE, como a de autorizar os Novos OGM/NGT na Agricultura Biológica (Emenda 4 10).

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